Figura 1 - Templo de Shri Radha Gopinatha, Vrindavana.
Sumário do Livro Madhurya, a Rasa da Doçura
A experiência que tenho é bem diferente das expressões indianas madhura-rasa de Shri Krishna, porque no Brasil há muitas pessoas que não sabem quem é Krishna, com raras exceções. Mas, de fato, o próprio Senhor explica em Rasa-tattva (2014): “Não há como corromper o que Eu contenho, porque isso está dentro de Mim e pertence a Mim. Eu mantenho-o existente enquanto pretendo expressá-lo como algo que se faz conter por ser o Meu próprio Ser sustentado”.
Enquanto me contém, Ele faz-me permanecer absorta em prema-bhakti, enquanto O sirvo. Estou absorta em lila transcendental e isso parece um evento passado que se faz presente, para acontecer novamente no futuro. Mas creio que não me faço entender, cabe-me, no entanto, começar a definir o que Krishna quer expressar através deste texto e de outros que serão expostos mais adiante.
Quando Ele veio fazer-me vê-Lo, eu estava a começar a despertar para a Verdadeira Identidade, que a alma tem necessidade de reconhecer. Tive que parar o que estava fazendo nessa experiência linear, onde eu me ocupava com uma carreira acadêmica materialista que nunca poderia me satisfazer (Ecologia) durante anos (1986-2004).
Assim, a necessidade de recuperar essa relação eterna permaneceu velada, enquanto Keshava desejou, fazendo-me experimentar uma das suas comunidades de devotos e em algum tempo da associação com pessoas que procuram visões de mundos sutis e outros poderes místicos. Agora, vivo a minha experiência em diferentes madhurya bhavas - swakiya (esposa) e parakiya (amante) -, pois o Senhor explica no Rasa Tattva que somos as mesmas pessoas, profundamente convencidas de nos doarmos reciprocamente por meio de diferentes formas de brincar.
Ser esposa ou amante, qualquer uma das duas experiências é possível à consciência para a qual Shri Krishna pretende manifestar-se como pati e upapati, em troca de sentimentos conjugais. Ele me dá incursões a um ou outro de seus universos intercalados, para que eu possa analisar com mais consistência o que significa estar de um lado e de outro de tal condição.
Há uma forte intenção de me unir ao meu Senhor de uma forma mais profunda. A união que, por vezes, parece que quero viver, levar-me-ia à Fonte que me contém. Mas, de forma alguma, quero privar-me da oportunidade de me relacionar com Ele. Além disso, no aprofundamento desta relação, não vejo diferença entre aqui e ali e o meu mundo torna-se completamente transcendental.
O amor que reciprocamos em doçura, através do qual Shyam se torna tão claro para a minha percepção, é único. Nem sequer sou capaz de descrever este sentimento com palavras escritas, como estou tentando fazer.
Estando num país diferente daquele onde o mundo de Shri Hari sempre se manifesta (Índia), preciso esclarecer que não se deve acreditar que a presença do Senhor está confinada a fronteiras particulares. Shri Krishna está em todo o lugar; as fronteiras físicas não delimitam a Ele e aos Seus associados.
O Senhor e a alma não têm nacionalidade, não importa se o corpo é branco ou escuro, masculino ou feminino. Quando a alma vive uma vida rendida a Krishna, ela está livre de qualquer qualificação externa. Quem vive esta profunda experiência de amor transcendental com Ele, que é a Fonte de tudo o que existe, não tem nada a temer.
Ao comentar sobre o Jaiva-dharma (de Shrila Bhaktivinoda Thakura), em um de nossos diálogos, Krishna afirmou que: “Este assunto é extremamente essencial porque, através dele, a alma esgotará o que a impede de estar Comigo. É necessário conhecer tudo o que foi escrito e ir além disso, para que se possa encontrar o que ainda não foi revelado”.
Desta forma, Ele revela-se numa situação diferente, estrangeira à Índia. Dessa forma, Ele também responde a uma pergunta que, se Krishna é Deus, então por que Ele só se manifesta e aos Seus passatempos no país indiano, o que é frequentemente uma pergunta entre os brasileiros.
Perguntas/Respostas
Diálogo Entre V d e Guru Ma Shri
1. O que quer dizer quando você menciona “parece um acontecimento passado que se torna presente, para voltar a acontecer no futuro”. O que é que vai acontecer de novo no futuro?
Estou falando da impressão de eternidade, que não tem um começo, nem um fim. A vida com Krishna é para sempre existente, por isso parece um acontecimento passado, pois os fatos da lila aconteceram em outra época do planeta. Ao mesmo tempo, eles continuam sendo vivenciados pela alma eterna no plano transcendental, sendo presentes. Por estarem associados aos ciclos de eras, eles voltarão a acontecer no planeta, por isso a impressão de que a experiência voltará a se fazer no futuro. A impressão eterna é assim, se comparada com a linear.
2. Krishna aceita múltiplas consortes, mas então como se estabelece a relação conjugal para diferentes formas de Deus - como Shri Ram - uma vez que Ele aceita apenas uma consorte - a Deusa Suprema?
Krishna e Rama são manifestações diferentes de uma mesma Pessoa Suprema. Trata-se da mesma Superalma, se expressando em lilas diferentes. Em cada uma delas, Ele decide se relacionar de uma maneira específica com Sua Consorte. Com Krishna, Ela está em Radha/Rukmini e nas gopis/esposas; e, em Rama, Ela está apenas em Sua manifestação mais plena em Sita, que é a mesma Suprema Deusa (Radha/Rukmini).
3. Em Dwarika prevalece swakiya rasa e em Vrindavan parakiya rasa, há lugar para o amor entre dois amantes solteiros (onde tanto Krishna como a alma estão solteiros em lila) ou swakiya bhava (casados com Krishna) na Leela de Vrindavan ou na morada divina do Senhor?
Em Vrindavana, Krishna é solteiro, mas suas amantes são casadas, por isso Ele se envolve com elas em parakiya rasa (humor extraconjugal). Em Dwarka, Ele é casado com Suas esposas, envolvendo-se com elas em swakiya rasa (humor conjugal). Não há nada além disso e as consortes vivem suas experiências plenas em tais humores, sem necessidade de criar algo próprio para si mesmas, diferente do que Ele mesmo propõe.
4. O que é o Bhava? Como é que as almas ainda presentes no corpo físico têm acesso a ele? Concebem-no mentalmente?
Bhava é um humor transcendental vívido e evidente de uma relação pessoal e íntima com a Pessoa de Deus, como parte das lilas dEle. Nós, almas presentes no corpo físico, que temos acesso a ele, o fazemos por meio da nossa consciência eterna original, a qual se manifesta espontaneamente e/ou como resultado de profunda busca por autorrealização. Não é uma concepção apenas mental, pois isso em si é muito perigoso, podendo gerar automistificação. O bhava eterno é na verdade o resultado da pureza da consciência, que transcendeu o mundo meramente linear e às necessidades do ego externo. Mas a mente se torna uma aliada dessa alma purificada, quando o manasi seva se faz possível, correspondendo à vivência mental da experiência interior com a Pessoa de Deus, mesmo enquanto ainda existe um corpo físico. Trata-se de uma realidade inquestionável para nós, que a experimentamos e nossa única identidade que jamais se perderá, pois é para sempre existente.
5. Nas expressões poéticas dos devotos é frequentemente mencionado que eles não têm qualquer desejo próprio e que se entregam completamente a Deus, então o devoto nem sequer deseja que Deus o mantenha perto de Si, que O ame e seja amado por Ele na rasa que o seu coração mais deseja?
O desejo por Deus não está em questão, pois é a única necessidade que o devoto deve cultivar. Porém, os devotos não têm outros desejos, que lhes sejam próprios, ou seja, que não façam parte da sua relação íntima com a Pessoa Suprema.
Figura 2 - Guru Ma Shri às margens do Rio Yamuna, Vrindavana.
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